como educar um saci

Gabriel, meu filho

o que que eu faço com você?

 

Você tá virado do avesso, me virando junto

você é o filho do Menino Maluquinho com a Emília. Sem medo da Cuca, e discípulo do Saci.

você é insubordinável, irreverente, inflexível nos seus fins,

mas flexibiliza os meios, tem ginga da malandragem: olhos atentos.

nasceu com pleno domínio de cada músculo, mas escolhe cair o dia inteiro. Porque tem a cabeça na próxima diabragem.

 

você é, pintado, meu riso de infância.

você tem a coragem que eu nunca tive para as desobediências.

você é aquele amigo da escola que eu adoraria ter.

 

mas você nasceu meu filho.

 

e aí? o que eu faço?

o que que é “educar” você?

o que fazer com essa parte minha que se recusa a se dobrar a qualquer coisa? que não dá aval pra castigo, que cospe (ou esculpe, como vc diz) na ordem estabelecida?

O que fazer naqueles dias na borda do limite, com nervos à flor da pele, com o caçula no colo e o mais velho na frente, quando preciso que você me obedeça e desejo, secretamente, que você nunca obedeça a ninguém?

que raio de função é essa, a de te ensinar limites? te ensinar que o outro existe, e que às vezes você passa da conta?

te ensinar que a existência do outro não é uma pedra no seu caminho? que o outro sente – inclusive dor – e você também?

você, que brotou do pó da obra, na construção desse lar que a gente vive. Você que veio ordenar o caos naquele momento, e agora coloca a casa abaixo.

 

só me resta te mostrar que você tem coração.

só me resta te ajudar a ouvir sua música, e perceber que com outros a gente faz uma orquestra de tambores em diferentes tons.

 

você é um desafio, maluquinho, porque é a parte que eu gostaria de ter sido, mas tinha moralismo demais na frente.

espero que meus braços não sejam prisões, mas um trampolim para alavancar seu vôo.

espero ter amor suficiente para superar meus próprios limites, porque às vezes o cansaço é grande. porque me mostra o ridículo de segurar o curso do rio, o curso do riso. quebrar a cabeça da lógica da ordem. espero que você, no meio dessa bagunça, esteja forjando bem seu caminho.

 

espero que fazer a coisa certa talvez não seja sempre fazer a coisa certa,

entre um tombo e uma bronca, entre um choro e um riso, a gente acerta.

 

eu sei que você consegue.

eu sei que eu também. porque te amo.

 

gabrirock

 

6 respostas para “como educar um saci”

  1. Terminei de ler chorando. Admiro todos os meus netos com todas as suas qualidades. Mas o Gabriel, é tudo o que a Clau fala no artigo acima. Não aceita as coisas normalmente. Sempre questionando. Sempre nos pondo em cheque. Certa vez ele chegou para mim e disse: Vôvô, eu não gosto de você. Perguntei-lhes por que ? Ele simplesmente, disse-me: Porque não gosto. Aí eu disse: Pois vôvô gosta muito de você assim mesmo. Saiu correndo de perto de mim, na maior alegria……
    Adorei o texto. Parabéns minha nora.

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